(PQ-CC) Percursos Químicos pela cidade de Coimbra

Percursos químicos diversos pela cidade de Coimbra que não estão incluidos no percurso Químico pela Universidade de Coimbra. Desde os monumentos às actividades humanas, passando por algumas curiosidades que revelam a importância da Química.


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(PQ-CC) Colóides à mesa do café

Sentemos-nos à mesa de um café (como o bonito Café Santa Cruz da fotografia), pastelaria ou restaurante e apreciemos a riqueza da química coloidal; muitas das coisas que comemos ou bebemos podem ser classificadas como misturas coloidais, ou colóides. Estes nomes podem ser uma dor de cabeça para os alunos, mas trata-se de um conceito muito simples: um colóide consiste numa mistura de materiais na qual pequenas partículas de um, ou mais, dos materiais estão dispersas num outro material (meio contínuo), sendo que ao microscópio, ou mesmo já à lupa, esta mistura apresenta um aspecto não homogéneo (se o aspecto não homogéneo for visível a olho nu a mistura costuma ser classificada como uma suspensão). Se o meio contínuo for transparente, fazendo incidir um ponteiro laser numa destas misturas (cuidado com os olhos!) o feixe deixa de se ver no seu interior devido à dispersão da luz pelas partículas, enquanto que continuará a ser visível ao atravessar uma solução verdadeira.

Um copo de leite é uma emulsão, ou seja a dispersão de um líquido noutro (a maionese e as natas também o são). A espuma do café, aliás como todas as espumas, é a dispersão de um gás num líquido. Note-se que o café expresso, se for bem tirado, é uma solução verdadeira, enquanto muitas vezes o café de saco fica turvo, sendo nesse caso um sol, ou seja a suspensão de partículas sólidas num líquido. Também um sol são os melhores sumos de laranja, por exemplo. As torradas e os bolos podem, de alguma forma, ser vistos como uma dispersão de bolhas de ar numa matriz sólida. O doce com que se barra uma torrada é em geral um gel, ou seja a dispersão de gotas de líquido num sólido (tal como o é a gelatina ou o queijo). Se o café ou o chá estiver muito quente, ou se estiver frio cá fora, pode formar-se um aerossol, uma dispersão de gotas de água a flutuar no ar. Se houver fumadores, ou se estiver a ser feito um churrasco, poderemos observar uma outra mistura coloidal o fumo, partículas sólidas a flutuar no ar. Só nos falta uma possibilidade, a dispersão de sólidos em sólidos, já que as misturas de gases formam sempre soluções verdadeiras. Peter Borrows refere as pérolas de um colar, mas julgo que há outras possibilidades que também podemos encontrar à mesa: os vidros e plásticos pigmentados. Para além destas misturas binárias há aquelas que envolvem várias fases e estados físicos (as misturas coloidais complexas) nas quais podemos incluir quase tudo o que está na mesa e que não foi ainda referido: o fiambre, o presunto, os bolos mais vistosos e os pratos culinários mais complexos. Para o grupo das soluções verdadeiras sobra o vinho, o chá, o café nas condições já referidas, os refrigerantes sem partículas em suspensão, e, claro, a água da torneira ou engarrafada que apresentam naturalmente (e ainda bem) sais dissolvidos.

Bom apetite!

Referência
P. Burrows Education in Chemistry, July 2009.

[Versão de 6 de Julho de 2010]

(PQ-CC) Química da ginjinha e do moscatel



A chegar à Sé-Velha, vindos da baixa, passamos por um letreiro sugestivo com indicação de ginjinha e moscatel. Tratam-se de duas bebidas alcoólicas com percentagens em volume de álcool de 17-20%, sendo a ginjinha um licor enquanto o moscatel é um vinho licoroso.

O licor de ginja, ou ginjinha, é obtido por maceração prolongada da ginja (fruto da Prunus cerasus L.) numa solução hidroalcoólica (aguardente vínica ou etanol, não o que é obtido nas farmácias que tem aditivos que o tornam inapropriado para essa função, em água), em quantidade suficiente para que o grau alcoólico fique cerca de 18% após a adição de uma calda açucarada. O sabor ácido das ginjas e da ginjinha provém do ácido málico (no lado direito) que este fruto tem em razoável quantidade Uma parte do sabor característico, em especial da ginjinha de Óbidos vem do aldeído cinâmico (no lado esquerdo) responsável pelo sabor e odor a canela.

O vinho licoroso moscatel é obtido a partir de uvas com uma percentagem elevada de castas moscatel. Na fase inicial da fermentação das uvas, adiciona-se aguardente vínica, geralmente a 77%, na quantidade necessária para que o grau alcoólico do vinho fique cerca de 18%. Posteriormente passa-se para a fase de maceração que pode atingir os seis meses.

Para saber mais:

Maria Luísa Alarcão-e-Silva e Alberto de Alarcão, Características fisico-quimicas e utilizações agro-alimentares da cereja e da ginja

António Ramos, Ginja de Óbidos e Alcobaça. Um produto tradicional a defender e preservar

Infovini, Moscatel de Setúbal

[versão preliminar de 30 de Setembro de 2010; com alterações de 6 de Outubro de 2010]

(PQ-CC) Ruas evocativas de químicos e cientistas que cultivaram a química


A porta Sul do Jardim Botânico dá para a Rua Vandelli que contorna o Jardim Escola João de Deus, o Hospital Militar e a Seminário. Domingos Vandelli (1739-1816) é o professor de química e história natural já referido noutra paragem; a placa é quase invisível.

A rua Tomé Rodrigues Sobral (1759-1829) acompanha a linha de combóio da Lousã, futura linha do metro, da estação e praça de taxis até à passagem de nível da Solum. A placa evoca apenas o facto de Rodrigues Sobral ter sido acidentalmente deputado, mas em outra paragem falámos já da sua actividade como químico.

Muito interessante é a Rua Costa Simões que liga a rotunda dos HUC à circular interna, em frente ao IBILI e Faculdades de Medicina e Farmácia. Na placa é referido que António Augusto Costa Simões (1819-1903) foi presidente da câmara de Coimbra. De facto foi-o durante dois anos, nos quais estudou e iniciou o abastecimento de água canalizada para a cidade. Mas foi também professor de medicina, investigador, director do hospital e fundador das escolas de enfermagem, entre outras coisas. No que concerne à química foi um divulgador e pioneiro na utilização da química forense, tendo publicado em 1855 sete artigos sobre química legal na revista O Instituto de que foram, numa publicação recente [1], denominados de forma sugestiva como CSI-Coimbra, 1855.

José Bonifácio de Andrade e Silva (1763-1838) dá nome à avenida nova que contorna o centro comercial Forum. Andrade e Silva foi professor de Metalurgia e teve alguma actividade científica na área da química paralela à sua actividade política.

Há também uma rua que evoca o Professor de Química e Reitor da Universidade de Coimbra, António Jorge Andrade de Gouveia (1905-2002).

Haverá mais ruas com nomes de químicos em Coimbra?

Referências
[1] A.J. Leonardo, D.R. Martins e C. Fiolhais António Costa Simões e a génese da química forense em Portugal, Revista da Sociedade Brasileira de História da Ciência 2, 192-205 (2009).

[versão de 28 de Maio de 2010; última alteração de 23 de Março de 2011]

(PQ-CC) Plantas perigosas que podemos encontrar na cidade

Ao passearmos pela cidade nem sempre reparamos nas plantas e flores que há por todo o lado. Algumas são muito tóxicas ou perigosas. Nas duas primeiras fotos, tiradas na zona onde vivo, podemos ver duas das plantas silvestres espontâneas mais tóxicas que temos em Portugal: a cicuta e o embude (não tenho absoluta certeza em relação a esta, mas noutros locais confirmei com um especialista). No primeiro caso trata-se da planta que tradicionalmente se diz ter sido usada para envenenar Sócrates (o filósofo), a qual contém um alcalóide que causa paralisia muscular (a coniína) [1]. No segundo caso a toxina é um álcool que tem uma estrutura química muito curiosa envolvendo o que os químicos denominam ligações triplas e duplas (a oenantoxina). A toxicidade desta molécula, cuja estrutura química se encontra representada aqui ao lado, está em grande parte relacionada com a sua geometria [2]. Para completar este conjunto temível, falta a foto de uma planta também muito comum e perigosa que é conhecida por figueira-do-diabo, da qual por esta altura há exemplares secos em vários locais. Esta planta é por vezes imprudentemente, e não raras vezes com efeitos fatais, usada como alucinogénico. Diz que sabe que, para além do perigo de envenenamento, as alucinações são muito más (daí o nome). Há também casos conhecidos de acidentes fatais devidos à ingestão acidental das sementes ou folhas.

Também por toda a cidade podemos encontrar as belas flores amarelas do hipericão. Trata-se de uma planta usada em medicina tradicional como anti-depressivo cujo efeito terapêutico que não está completamente comprovado. O que está comprovado é que um dos seus compostos activos (a hipericina) é muito sensível à luz e que o seu uso regular acompanhado de exposição ao sol pode levar à sensibilização da pele entre outros efeitos (claro, que o composto responsável por este efeito está a ser estudado para terapia fotodinâmica!) Além disso, os extractos da planta mostraram ser activadores do metabolismo e do sistema imunitário e por isso o seu uso em conjunto com imunodepressores (por exemplo em doentes de transplantes) pode ser perigoso. Actualmente aceita-se que a acção antidepressiva dos extractos desta planta são devidos à hiperforina e não à hipericina como se terá julgado anteriormente [3].

Finalmente há que referir o rícino que aparece em vários jardins pela cidade. As folhas do bonito exemplar da foto ao lado estão neste momento com uma coloração avermelhada, mas noutras alturas do ano podem ser apreciadas outras cores (veja-se a paragem sobre o outono). As sementes desta planta são muito perigosas pois contêm uma proteína vegetal muito tóxica, o rícino. Este, após ser extraído e purificado é um dos mais famosos compostos da lista conhecida de armas químicas, infelizmente, existentes actualmente. Lembram-se das cartas com pó branco que geraram o pânico nos EUA há uns anos?

[1] artigo da Wikipedia sobre a coniína. Alcalóides são espécies químicas que ocorrem naturalmente nas plantas e que contêm átomos de azoto que lhes dão um comportamento básico (alcalino). A coniína, a nicotina e a cafeína são alcalóides.

[2] K. Uwai et al. J. Med. Chem. 43, 2000, 4508-4515; artigo da Wikipedia sobre a oenotoxina.A oenotoxina não é um alcalóide pois não tem átomos de azoto.

[3] J. Volmer e J. Rosenson J. Chem. Educ. 81, 2004, 1450; artigos da Wikipedia sobre a hiperforina e a hipericina.

[versão de 27 de Abril de 2010. Última alteração de 27 de Maio de 2010]

(PQ-CC) Química na piscina

Quando começa a estar calor apetece ir à piscina. Penso que não estraga a festa a ninguém referir que uma grande variedade de conceitos de química pode ser relacionada com as piscinas: pH, ácidos e bases, equilíbrio químico, reacções de oxidação-redução, propriedades do cloro, etc.

Mas por que razão é necessária a química numa piscina? Antes de mais, deve notar-se que a água, mesmo em condições naturais, está sempre envolvida em reacções e equilíbrios químicos. No caso das piscinas, como a água não pode estar sempre a ser mudada, além de que é usada por muita gente, é necessário impedir a contaminação por microorganismos. É para isso que serve o cloro e outros tratamentos químicos; e conhecer a química envolvida contribui para minimizar os riscos envolvidos. Aqui, sentados à beira da piscina, iremos falar um pouco dessa química...

Referência
Ben Selinger, Chemistry in the marketplace, 4th ed, Harcourt, 1989.

[versão preliminar de 6 de Junho de 2010]