Texto com passeios químicos preparado por altura do dia da criança, 8 de Junho de 2011...
Uma sugestão atrasada, mas talvez ainda actual. Aproveitar o Ano Internacional da Química e das Florestas e sair para a rua com as crianças à procura de química e das árvores.
Nos Arcos do Jardim ou em construções de betão podem ver-se as estalactites artificiais que se formaram por precipitação de carbonato de cálcio, o principal componente das rochas calcárias. Nalguns casos podem ver-se manchas castanhas de sais, provavelmente, de ferro. Nos monumentos podem ainda observar-se as marcas das chuvas ácidas, a formação de gesso (camadas pouco compactas de material branco) e o aparecimento das crostas negras devidas ao carbono, compostos muito ricos neste elemento e poeiras que circulam no ar. Notar que é a mesma cor negra que adquirem as pastilhas elásticas, as quais, infelizmente, se vão encontrando pelo chão por todo o lado. (Uma oportunidade educacional, mas convém não exagerar!)
Observemos os metais que nos rodeiam. O aspecto e a cor característicos da ferrugem, comparados com a cor do ferro e do aço não enferrujados, o verde da oxidação do cobre, em contraste com a sua bem conhecida cor castanha. A cor cinzenta, por vezes com manchas de diferentes tonalidades, do aço galvanizado (revestido de zinco) e a sua resistência à corrosão. Usar um íman para testar se os metais têm comportamento (ferro)magnético: verificar que o cobre e o alumínio não são magnéticos em contraste com o ferro. Testar as moedas de dois a dez cêntimos e concluir que por baixo do seu cobre exterior deverá haver ferro ou outro metal magnético. Notar o comportamento magnético do ferro galvanizado e das latas de refrigerantes (mas não da tampa de abertura fácil, porquê?). Mas, ao mesmo tempo, como verdadeiros cientistas, estarem preparados para encontrar factos aparentemente discrepantes: alguns tipos de aço inox não são magnéticos por terem uma estrutura cristalina que não origina o comportamento ferromagnético.
No Jardim Botânico podem ser recolhidas folhas (no chão) de diferentes eucalipto. Um momento para prestar atenção aos odores. Notar o cheiro da relva acabada de cortar, das flores, da terra molhada. E voltando aos metais: porque parecem as moedas ter cheiro quando lhes tocamos? Os químicos já investigaram: porque, nas nossas mãos, os metais catalisam reacções de formação de compostos com odores característicos a partir dos compostos nosso suor. Nem sempre temos explicação para tudo, mas é isso que torna a vida interessante. Quem não tem dúvidas, ou sabe tudo,
aborrece-se muito!
Olhar com atenção para as árvores dos parques e das ruas. Reparar nos seus frutos (alguns comestíveis, outros não), folhas e flores. Sentir os seus cheiros, tentar identificar os seus nomes e conhecer as suas histórias. Coleccionar folhas, observar os pássaros. Tomar notas, observar, desenhar. Aprender que o esforço e a dedicação dão os melhores frutos. Contar montes de terra das toupeiras, encontrar grilos (mas não os molestar). Sujar as mão com terra e depois fazer experiências a lavá-las. Primeiro só com água e depois com sabão para confirmar que a sujidade que não saiu com água se manifesta de forma bem visível (experimentar na parede do lavatório antes de sujar a toalha.)
Agora que começa o calor, podemos fazer algumas experiência simples com água na rua. Verificar que o gelo flutua e que o nível da água não se altera. E que os pedaços de maça flutuam, mas não os de batata, notando que estes últimos podem ser levados a flutuar se a água tiver muito sal dissolvido. Colocar clips de metal a flutuar num copo com água para observar o efeito da tensão superficial. Ou modelar pequenos barcos em folha de alumínio. Juntar uma gota de detergente e ver que os clips e alguns barcos se afundam, mas não as bolas de papel de alumínio, porquê? Relacionar as observações com os insectos que caminham sobre a água (os alfaiates) e com os patos que nadam no rio.
O indicador de couve rocha é muito fácil de preparar: ferver umas folhas deste legume em água, deixar arrefecer e já está. O vinagre, o limão e outros materiais ácidos, em contacto com esta solução, ficam de um vermelho muito intenso, enquanto os materiais básicos apresentam gradações de azul, verde ou amarelo. Os detergentes das máquinas de lavar e a lixívia são os materiais mais básicos e também os mais perigosos. Aqui pode relembrar-se às crianças os símbolos de perigo que são colocados nestes produtos. Podem também preparar-se sumos naturais e artificiais de framboesa ou uva e usar bicarbonato e vinagre para testar quais são os que têm corantes naturais e artificiais (os últimos não mudam de cor).
Podemos ainda extrair com um íman o ferro dos cereais enriquecidos neste elemento, depois de os triturarmos bem. Separar os corantes alimentares de doces coloridos, ou os corantes artificiais usados nas canetas de feltro, usando uma técnica da cromatografia rudimentar: colocar uma tira de papel com as manchas dos corantes num copo pequeno com uma pequena quantidade de álcool e observar. Actividades mais elaboradas e acompanhadas por monitores entusiastas e bem preparados podem ser encontradas no Museu da Ciência da Universidade de Coimbra ou no Exploratório Infante D. Henrique, claro. Mas não é o mesmo que sermos nós a fazê-las, mesmo correndo o risco de falar. A frustração e o erro podem ser momentos de aprendizagem.
Hoje em dia quase já não há conjuntos de química para as crianças brincarem, e, os que existem, apenas contêm produtos relativamente inócuos como gelatina, sal e bicarbonato. Para além de fazer um pega-monstro com cola, água e borax, juntar vinagre e bicarbonato num recipiente de boca estreita para encher um balão, ou fazer um pseudo-vulcão, parecem ser as maiores emoções químicas permitidas às crianças. E no entanto, a mesma sociedade tão sensível aos potenciais riscos, vai encolhendo os ombros à velocidade excessiva nas estradas e ruas, ao excesso de doces e gorduras e a um ensino que cada vez menos valoriza a capacidade de fazer, a manipulação dos materiais e o espírito crítico.
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