Passeio Químico em Proença-a-Nova (III)


Terceira e última parte do Passeio Químico realizado em Proença-a-Nova em 2011, seguindo a parte I e parte II (mapa em breve).

O Aloe Vera é uma planta muito usada em remédios e cosméticos naturais. Ainda não terá sido descoberto, nesta planta, nenhum princípio activo eficaz que possa ser usado como base para o desenvolvimento de medicamentos (um lead), mas a maioria dos estudos realizados indica que os extractos desta planta têm efeitos benéficos gerais. No entanto, não podemos cair na falácia de que alguma coisa não pode fazer mal por ser natural. De facto, há pelo menos um caso documentado de uma potencial interacção entre um anestésico e a ingestão de comprimidos de Aloe Vera.
Os eucaliptos têm uma grande história de serem mal amados devido a terem sido plantados de forma exagerada em locais errados e em monocultura – de notar que isto foi escrito em 2011 e, tanto na altura como agora, não me junto ao coro dos que diabolizam esta árvore cuja plantação deve ser controlada e ordenada, mas não faz sentido ser proibida. Trata-se de uma árvore da qual se aproveita, para além da celulose para a pasta de papel, muitos óleos essenciais. Há muitas espécies, sendo que na maioria o terpenóide eucaliptol domina. Há, no entanto, uma espécie cujas folhas cheiram a limão por conterem citronelal, um isómero do eucaliptol. E já que falamos tanto de terpenos e terpenóides vamos explicar melhor. Trata-se de moléculas construídas como um lego que tem como peça mais simples o isopreno de fórmula empírica C5H8. Surgem na natureza contendo múltiplos de cinco carbonos: com cinco, dez e quinze átomos de carbono em moléculas com odores característicos que têm diversas funções, com vinte ou mais átomos de carbono em moléculas que têm funções de interacção com a luz, com centenas de átomos de carbono nos poli-isoprenos que originam a borracha natural.
A grevília é uma árvore que é muito cultivada pela sua sombra e beleza especialmente na Austrália de onde é originária.  Nas suas folhas existem compostos que fazem guerra química às plantas que a rodeiam, sendo por isso também estudada para o desenvolvimento de herbicidas. Em zonas com muita população destas árvores, a sua contribuição para os aerossóis de compostos orgânicos voláteis (uma forma de poluição conhecida como VOC) é relativamente importante.  

Os pinheiros são nossos velhos conhecidos e uma fonte de riqueza importante. Para além da madeira para construção ou pasta de papel (cada vez menos), da resina extrai-se uma grande quantidade de compostos. A terebintina ou aguarraz é a parte volátil, sendo constituída por vários terpenos em especial o alfa-pineno. A colofónia, ou pez louro, é a parte não volátil. Ambas têm muitas aplicações. Para fazer papel, nas celuloses extraem-se as fibras de celulose por vários processos alguns deles mal-cheirosos devido à nossa grande sensibilidade para com os compostos de enxofre usados. Podemos poupar árvores e energia reciclando o papel, mas ao contrário do que acontece com o vidro, o ferro ou o alumínio, as fibras de celulose vão-se fragilizando nas sucessivas reciclagens.  A preocupação actual com o espalhamento do nemátodo do pinheiro coloca-nos várias questões, algumas delas de natureza química. Combater o vector com insecticidas? Usar nematicidas? Destruir apenas as árvores infectadas? Será que teríamos evitado isto misturando os pinheiros com espécies cujos compostos voláteis têm propriedades nematicidas como parecem ter os liquidambares?  
Os compostos e extractos da mélia ou amargoseira têm muito interesse. Têm um comprovado efeito larvicida e insecticida importante. Em zonas com muitas destas árvores, a diminuição dos mosquitos e moscas é notória. Os seus frutos são relativamente tóxicos e são conhecidos envenenamentos de animais com estes.

A paragem seguinte foi junto a um supermercado. Neste ponto pensemos um pouco na química que podemos encontrar nos rótulos dos produtos nos supermercados que não está lá para nos assustar, mas sim informar. Os iões que são indicados na água engarrafada também existem nas fontes, ou na água da torneira. A diferença é que a da fonte pode não ter sido analisada e a da torneira pode ter uma quantidade mínima de cloro que está lá para nos proteger de micro-organismos. Também os aditivos alimentares com os seus famosos números-E estão lá para uma função útil, como seja a preservação ou a manutenção de uma caracterísitica e não para serem tóxicos ou cancerígenos. Podem ser compostos inofensivos ou suspeitos de causar alergias, mas se fossem cancerígenos ou tóxicos não estariam lá. E, obviamente, nem os champôs nem os desodorizantes têm compostos cancerígenos, como por vezes se recebe por e-mail ou se encontra nas redes sociais. De qualquer forma podem evitar-se os compostos presentes nos xampôs e desodorizantes usando sabão azul para lavar o cabelo e não colocar nada nas axilas...

Chegámos de seguida junto de uma oliveira. Das azeitonas extrai-se esse sumo maravilhoso que já é referido na bíblia, o azeite. As suas propriedades e métodos de produção são bem conhecidos, assim como os significados dos termos “azeite virgem extra,”  “azeite virgem” e “azeite.”  O azeite tem como principais componentes o ácido oleico e o ácido linoleico. No entanto, a acidez é percentagem dos ácidos gordos livres, dado que a maioria destes está na forma de triglicéridos.  Em geral a acidez não tem um efeito perceptível no sabor que é resultado da complexa mistura dos vários tipos de compostos presentes. Nos rótulos aparece também o índice de peróxidos e a absorvância a determinados comprimentos de onda que permitem avaliar o grau de oxidação do azeite na altura do engarrafamento. Mas uma vez aberto e exposto à luz ou a temperaturas elevadas o aumento da oxidação é inevitável.
Bombas de combustíveis. A química e os químicos estão particularmente empenhados em contribuir para a poupança de energia e o desenvolvimento de combustíveis alternativos, desde o bio-diesel ao hidrogénio.  Os combustíveis mais comuns, gasolina e gasóleo, são misturas de hidrocarbonetos. Um dos aditivos mais famigerados foi o tetraetilchumbo, inventado por Thomas Midgley Jr. para aumentar o poder detonante das gasolinas. Com a melhoria da qualidade dos carros e a introdução do catalisador este aditivo tóxico deixou de ser usado. A química está presente em todas as partes dos automóveis e poderíamos falar horas sobre isso. Para além dos combustíveis, nos materiais de que é feito um carro, na pintura e nos tratamentos anti-corrosão, nos vidros e nos espelhos, nos lubrificantes, nos gases de escape, nos métodos usados para minimizar esses gases, no motor, no catalisador, no ar condicionado, nas baterias, no air-bag, etc.
Encontrámos de seguida um sobreiro e um azevinho. Como toda a gente sabe, a cortiça é a casca do sobreiro. Um tecido vegetal que tem imensas aplicações e de que somos o maior produtor e transformador mundial.  Os aspectos recentes da discussão entre as rolhas de cortiça e de plástico têm vários aspectos pedagógicos. Assim como o recente interesse pela sua reciclagem e o aproveitamento de desperdícios de cortiça que, com a ajuda da química, se transformam de pavimentos a objectos de design. O azevinho, em especial os seus frutos, é tóxico. Por isso com certeza que está a ser estudado para se encontrarem princípios activos anti-tumorais ou outros.
O ar-condicionado moderno utiliza compostos, dentro de um mecanismo estanque, que, no exterior da habitação são comprimidos, passando do estado gasoso a líquido, aquecendo o meio exterior, e no interior da habitação são expandidos, passando do estado líquido ao de vapor, arrefecendo o meio interior. Os CFC, inventados pelo nosso já conhecido Thomas Midgley Jr., revelaram-se as moléculas ideias para usar como refrigerantes. O problema é que estas moléculas ao subirem para a estratosfera contribuem para a depleção da camada do ozono. Assim, os CFC foram banidos e substituidos por espécies mais amigas do ozono como os hidrogenoclorofluorocarbonetos (HCFC). Mas a história não fica por aqui pois estes gases estão-se a revelar também problemáticos por contribuirem para o chamado aumento do efeito de estufa e estão também a ser banidos. Novos compostos têm sido desenvolvidos, desenhados primeiro teoricamente de forma a que não causem danos ao ozono nem contribuam para o efeito de estufa.
O passeio terminou junto da Pousada das Amoreiras. Entre as muitas coisas que haveria para referir, escolheu-se a piscina. O tratamento da água das piscinas tem aspectos químicos importantes, mas simples. Como a água não pode ser mudada com frequência, usam-se compostos oxidantes de cloro ou bromo para  destruir os micro-organismos. Para maior eficácia a acidez da água tem de ser corrigida. Também se usam compostos de cobre para combater os fungos e as algas. 

1 comentário:

Unknown disse...
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