Esta viagem por Madrid começa pela leitura do “Amanhã na batalha pensa em mim”, de 1994, de Javier Marías e estende-se a outros caminhos e terá mais episódios. O nome deste romance é uma citação de Shakespeare, mais concretamente de uma fala do fantasma de Ana no Ricardo III e tem muitas histórias que se cruzam, como toda a boa literatura. Não quero desvendar a trama que é complexa ao mesmo tempo límpida. Gostei e recomendo. Li a versão portuguesa, mas comprei a espanhola. Madrid tem tantos pontos de interesse e nem sabemos por onde começar: Javier Marías, Joaquim Sabina, Pedro Almodovar, Buñuel, Unamuno, Cervantes, Picasso, os jardins, os ferros forjados, a história, sei lá! Tudo tem química, é preciso dizer. “Madrid me mata!” reza a expressão e acredito seja verdade.
O livro de Marías começa com uma morte. Poderíamos falar da química da morte. Tenho aqui comigo, além do livro de Marias, vários guias e memórias, em particular, o “Desvio a Santiago” e a “Historia de Espanha para Céticos”. Achei especial piada também aos “150 planos para conquistar Madrid”. Um deles é, por exemplo, visitar um museu de horrores, outro fazer um percurso tétrico.
Os espanhóis são famosos pela sua cultura incrível mas também pela sua inquisição insana, pela sua guerra civil sangrenta, pela sua ditadura quase esquecida (mas que deixou muitas sequelas) e o terrorismo violento, entre outras coisas. Mas não falemos da química de tudo isso. Comecemos pela química no livro de Marías. Numa dada parte, uma personagem encontra um tubo de Redoxan efevercente. Podímos ficar por aqui, mas não. Nunca um detective químico! Diz a wikipedia que Redoxon era o nome comercial do primeiro ácido ascórbico artificial (sintetizado). E que o Redoxon foi comercializada pela primeira vez para o público em geral pela Hoffman-La Roche em 1934, tornando-se a primeira vitamina sintética fabricada em massa na história. Curiosamente, no interessante capítulo sobre a vitamina C do livro “Os botões de Napoleão: 17 moléculas que mudaram a história” surge a velha história de que o tratamento para o escorbuto foi descoberto pelo pelo capitão Cook. Não será bem assim, mas é assim que está publicado, mas essa discussão fica para outro percurso. Por agora basta ter a certeza de que a vitamina C artificial é exactamente igual à natural e que os comprimidos efevercentes têm um carbonato que produz dióxido de carbono em água.
No livro de Marías é também referido um determinado método de mastigação que converte os sólidos em líquidos, atribuído a Fletcher. Mastigar tem semelhanças com a moderna técnica de moer para acelerar as reações químicas, mas mastigar envolve também enzimas que vão quebrar os alimentos. Em Espanha também se passou fome como em Portugal. A farinha de Almortas (chícharos) foi proibida até há algum tempo porque causava muitas paralisias, especialmente nas épocas de fome. Outras histórias químicas, outros caminho a seguir.
Em várias partes do livro podemos viajar pelas ruas de Madrid, o que é bastante interessante. O livro também tem referência a cheiros e drogas como a cocaína. Num dado momento, uma personagem secundária fica grávida porque provavelmente os métodos anticoncepcionais falharam (é referido que “tivemos cuidado” mas não é referido quais são os métodos). A verdade é que já temos pílula anticoncepcional desde o princípio dos anos sessenta e esta chega a Espanha em meados dos anos sessenta. Com prescrição médica ou clandestinamente. Até meados dos anos setenta será crime falar publicamente de planeamento familiar. Comprar preservativos era uma actividade discreta. Os ricos abortavam em Inglaterra ou Escócia. A tal personagem do livro vai a Inglaterra.
Deixemos o livro de Marías e saiamos para as ruas de Madrid. Há muito para ver, claro. Passemos pela praça Cibeles e apreciemos a beleza e os materiais de que são feitas as estátuas, olhemos para os materiais e robustez das contruções, muitas vezes muito feias, outras vezes belas. Notemos na Gran Via que muitas construções têm ferro forjado (aliás há muito ferro forjado em Espanha), voltarei a isso. Notemos as muitas árvores e a água corrente. Madrid pode ser muito fria e húmida no inverno e muito quente e seca no verão. Olhemos para os edificios “modernos”, por exemplo para o Metropolis. Será que é ouro o que luze?
Madrid é grande, muito grande. Do Paseo e Museo Prado passamos para o Paseo dos Recolectos e chegamos ao Paseo de la Castellana. Chamou-me a atenção a zona, uma rua e um hotel com um jardim romântico chamado Orfila. Não tem indicação na placa, mas quase de certeza que se trata do grande químico espanhol do século XIX, Mathieu Joseph Bonaventure Orfila (1787–1853), “pai” da toxicologia forense moderna. Poucos madrilenos sabem de onde vem o nome dessa rua. Itemos aos Jardins tropicais da estação de Atocha, visitaremos o Parque do Retiro e as estufas tropicais do Palácio de Cristal. Há muitas coisas químicas para fazer em Madrid mesmo à segunda-feira.
[translation, semi-authomatic, corrected]
This trip through Madrid begins with the reading of “Tomorrow in the battle think of me”, from 1994, by Javier Marías and extends to other paths and will have more episodes. The name of this book is a quote from Shakespeare, more specifically a speech of Ana's ghost in Richard III and has many stories that intersect, like all good literature. I don't want to unravel the plot that is complex and at the same time clear. I liked it and recommend it. I read the Portuguese version, but I bought the Spanish one. Madrid has so many points of interest that we don't even know where to start: Javiar Marías, Joaquim Sabina, Almodovar, Buñuel, Unamuno, Cervantes, Picasso, the gardens, the forged irons, the history, I don't know! Everything has chemistry, need to say. "Madrid kills me!" says the expression and I believe it to be true.
Marías' book begins with a death. We could talk about the chemistry of death. I have here with me, in addition to Marias' book, several guides and memoirs “The Deviation to Santiago” and the “History of Spain for Skeptics.” I also found a special joke to “150 plans to conquer Madrid”. One is, for example, visiting a museum of horrors, the other taking a tetrical route.
Spain is famous, not only due to its amazing culture, but also for their ancient insane inquisition, for their bloody civil war, for their almost forgotten dictatorship that left many sequels, and its bloody terrorism. But let's not talk about the chemistry of this. Let's start with chemistry in Marías' book. In a given part, a character finds an effective Redoxan tube. We could stop here, but no. Never a chemical detective. The wikipedia says that Redoxon was the trade name of the first artificial (synthesized) ascorbic acid. And that Redoxon was first marketed to the general public by Hoffman-La Roche in 1934, becoming the first mass-produced synthetic vitamin in history. Interestingly, in the interesting chapter on vitamin C in the book “Napoleon's buds: 17 molecules that changed history” comes the old story that the treatment for scurvy was discovered by Captain Cook. It will not be so, but this is how it is published, but this discussion is for another journey. For now, just be sure that artificial vitamin C is exactly the same as natural vitamin and that effective pills have a carbonate that produces carbon dioxide in water.
In Marias' book there is also a specific method of chewing that converts solids into liquids, attributed to Fletcher. Chewing has similarities to the modern grinding technique of Green Chemistry to speed up chemical reactions, but chewing also involves enzymes that will break down food. In Spain there was also a famine as in Portugal. Almortas flour (“chícharos” I didn’t find a translation but is similar to chickpeas) was banned until some time ago because it caused many paralysis, especially in times of famine. Other chemical stories to follow.
In various parts of the book we can travel the streets of Madrid, which is quite interesting. The book has also references to smells and drugs like cocaine. Other chemical trails. At a given moment, a secondary character becomes pregnant because probably the contraceptive methods have failed (it is said that “we were careful” but the methods are not mentioned). The truth is that we have had birth control pill since the early sixties and it arrived in Spain in the mid sixties. With medical prescription or clandestinely. Note that, until the mid-seventies it would be a crime to speak publicly about family planning. Buying condoms was a discreet activity. The rich aborted in England or Scotland. The character from the book goes to England.
Let us leave the book of Marias and go out into the streets of Madrid. There is much to see, of course. Let us pass by Cibeles square and appreciate the beauty and the materials from which the statues are made, look at the materials and strength of the constructions, often very ugly, other times beautiful. Let us note in Gran Via that many buildings have wrought iron (in fact there is a lot of wrought iron in Spain), I will come back to that. Notice the many trees and the running water. Madrid can be very cold and wet in the winter and very hot and dry in the summer. Let us look at “modern” buildings, for example Metropolis. Is it gold that shines?
Madrid is big, very big. From Paseo and Museo Prado we pass to Paseo dos Recolectos and arrive to Paseo de la Castellana. The area, a street and a hotel (with a romantic garden) called Orfila caught our attention. It has no indication on the plaque, but it is almost certainly tat was after the great 19th century Spanish chemist, Mathieu Joseph Bonaventure Orfila (1787–1853), “father” of modern forensic toxicology. Few Madrileños know where the name of this street comes from. We will go to the tropical gardens of Atocha station, visit the Parque do Retiro, and the tropical greenhouses of the Crystal Palace in other trails. There are many chemical things to do in Madrid even on Monday.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário