Passeio Químico em Canas de Senhorim

[Fui em abril dar uma palestra na Escola de Canas de Senhorim e aproveitei para tirar algumas fotografias e refletir sobre esta povoação interessante, cheia de história e potencialidades, com alunos e professores muito motivados e algo abandonada pelos poderes nacionais e locais. Na altura comi num restaurante muito bom chamado “Zé Pataco”. Entretanto já lá voltei. O ficheiro, no entanto, ficou adormecido e só agora acordou.]

Canas de Senhorim é uma Vila muito antiga, onde estiveram instaladas muitas empresas, mas nunca lá tinha parado. Mas já antes tinha escrito sobre as minas da Urgeiriça que é em Canas de Senhorim (mas não o escrevi) e tinha reparada nas ruínas da Companhia Portuguesa de Fornos Elétricos (CPFE) que se veem da estrada. Tinha-me chamado a atenção em particular um edifício que tinha a palavra “azoto”, mas nunca tive tempo de parar. Em Canas de Senhorim há uma homenagem aos mineiros perto da escola. Trata-se de uma coluna com um relevo em bronze interessante mas de certa forma esquecido num jardim. Como toda a gente já reparou, o cobre (de que o bronze é o principal constituinte) das estátuas, relevos e coberturas começa por ser castanho mas adquire um aspeto verde devido aos óxidos deste metal. Pode também reparar-se noutros lugares, em que nada, quando os materiais são novos, indicia haver cobre, mas lentamente lá vão aparecendo as escorrências e coberturas verdes. Já me perguntei porque algumas coberturas e  estátuas não parece acontecer isso, mas suspeito que tem a ver com serem demasiado novas ou estarem cobertas de verniz. Ou podem ser de aço corten que se cobre com uma camada de óxido avermelhada que de longe pode parecer cobre.

Mas não nos percamos. Virei para a esquerda da estrada onde passo por vezes a caminho da Serra da Estrela. Logo na entrada da vila dei conta de uma fábrica abandonada (infelizmente em Canas há algumas fábricas assim) e reparei nuns dizeres apagados: “Quimigal”. Mais à frente encontrei letreiros novos da ADP (Adubos de Portugal). Para quem não sabe, a ADP é agora do grupo Fertiberia S. A., que está centrado em Espanha. Mas podemos ir ainda mais longe para tentar perceber esta trama. A origem é a CUF (Companhia União Fabril), que depois de nacionalizada ficou com o nome de Quimigal. Entretanto, o Grupo Mello, herdeiro da CUF, voltou a adquiri-la e separou os seus negócios químicos, a que deu o nome de Bondalti, dos negócios da saúde, onde usou o nome CUF, que agora toda a gente associa a hospitais. Entretanto a Bondalti trocou com o grupo espanhol várias fábricas. As de adubos ficaram para o grupo espanhol e as de hipoclorito e cloro para o grupo português. Julgo que estou a simplificar, mas também não tenho toda informação como é óbvio.

Na CPFE produziu-se, entre outras coisas, carbureto de cálcio que era usado nos gasómetros. Com a junção de água forma-se etileno que depois pode ser queimado, originando a iluminação característica. A reação química é a seguinte

CaC2+H2O → C2H2+CaO

Penso que nesta fábrica também se produziam equipamentos que precisavam de vidro (foi retirada uma grande quantidade deste material da antiga fábrica) e quartzo. Aliás o Museu do Quartzo não é longe, ficando perto de uma lagoa muito bonita que agora está no local onde era extraído o quartzo.  

Todas estas memórias de um tempo que já passou não precisam de ser feias ou estar mal cuidadas.  Podemos ter memórias industriais bem enquadradas e aproveitadas. Na Urgeiriça foi feito um hotel e ficam perto de Canas de Senhorim as termas das Caldas da Felgueira, que remontam ao início do século XIX. Não fui lá, mas lendo o seu sítio na Internet reparei em duas coisas: que a água emerge a 35ºC e que tem algum enxofre. Pode não ser a solução milagrosa para todos os achaques e para rejuvenescer, mas é com certeza benéfica para o corpo e para a mente. E a mente, em particular a memória, é fundamental.

Sem comentários:

Enviar um comentário